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Mais um livreiro no céu



O mercado fluminense foi privado neste 11 de setembro de Isaque Lerbak, atuante e empreendedor profissional à frente da tradicional Livraria Eldorado, que, aos 62  anos, faleceu vitimado por um câncer.

Isaque também era sócio da Distribuidora de Livros Eldorado, da Livraria Copabooks e diretor financeiro da AEL RJ, pelo terceiro mandato consecutivo. Como associado, defendia posições firmes principalmente na relação com as editoras.

Na última Convenção Nacional de Livrarias, no Rio, em 2019, participou de uma mesa com o presidente da AEL, Antonio Carlos de Carvalho, da Livraria Galileu, em que questionou o patrocínio de editoras e de um gigante do comércio on-line ao evento, que deveria protestar contra a falta de ética no mercado desses mesmos patrocinadores.

Em um debate sobre o livro didático transmitido pelo Canal Futura, em fevereiro deste ano, com o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, Marcos Pereira, questionou a venda de livros nas escolas pelas editoras, que quebram a cadeia produtiva do livro e com isso, segundo ele, dão um tiro no próprio pé.

Natural do Espírito Santo, Isaque veio para o Méier, subúrbio carioca, com  9 anos,  e só  conheceu uma livraria aos 23,  quando se empregou na loja da Melhoramentos, na Tijuca, onde disse ter se  deparado com um mundo de informação que desconhecia.

Alí começou a carreira no mercado editorial; primeiro como limpador de livros e depois como atendente, vendedor pracista, até se tornar livreiro, distribuidor e editor. Mas, para ele, figura popular na Tijuca, "o melhor lugar do mundo" era estar na loja conversando com o cliente.

Com uma visão tradicional, dizia estar na contramão das lojas que oferecem outros produtos e serviços como o café; que a atração da sua livraria  é o livro. Mas a Eldorado também promove lançamentos, geralmente de autores da região e alguns famosos, como Ziraldo, amigo de longa data.

Os dois se conheceram  na Bienal do Livro de 1982, no Hotel Copacabana Palace, e alí iniciaram uma amizade que seguiu através dos anos a ponto de Isaque, ao invés de ter uma foto sua no perfil do whatsapp, manter a imagem do Menino Maluquinho, personagem do cartunista.

Em 2016 , Ziraldo, que segundo Isaque foi o grande incentivador para que se tornasse livreiro, lançou na Eldorado o livro As meninas numa concorrida tarde de autógrafos que reuniu alunos de escolas da região, público fundamental para a loja.

Primeira livraria da Tijuca, fundada em 1961, a Eldorado sempre  teve o livro didático como carro chefe, tradição mantida por Isaque, que a adquiriu em 1998 junto com Jovaldo de Almeida então comprador da rede Sodiler enquanto ele era vendedor pracista da Melhoramentos.

Nessa função Isaque conheceu e acompanhou a trajetória de  muitos livreiros cariocas desde Rui Campos, da Livraria da Travessa, nos tempos em que trabalhava na Livraria Dazibao, até nomes ´que já eram lendários quando entrou no mercado como Dona Vanna, da Leonardo da Vinci, e Alberto Abreu, da Padrão.

Como divulgador da Melhoramentos também fez amizade com vários autores como Ana Maria Machado, "me ensinou a ser produtivo na divulgação"; Marina Colasanti, "uma aula de cultura" e Maria Dinorah, "com ela tudo se transformava em poesia".

Como livreiro também se tornou amigo de muitos clientes como o compositor e escritor Aldir Blanc, assíduo frequentador da Eldorado, falecido em maio deste ano, que, a pedido de Isaque escreveu o texto da contracapa do Guia de Livrarias da Cidade do Rio de Janeiro, lançado pela AEL em 2017:

"Em meu Paraiso, livrarias são mananciais de saber.. Parafraseando Ruy Castro, um céu sem sebos é mentira."

 

11/9/2020