O negro na livraria
Evento da AELRJ, levou à Bienal do Livro, neste sábado, discussão sobre a presença do negro no mercado editorial brasileiro - do autor ao leitor - no estande Paixão de Ler, mais antiga campanha da Secretaria Municipal de Cultura que, desde 1992, incentiva a literatura.
Ronaldo Ventania, da Hilário Livraria, com a palavra na Bienal - foto Victor Gomes
Três negros foram homenageados este ano na Paixão de Ler, o carioca Lima Barreto, a mineira Carolina de Jesus e o baiano Luis Gama. A mesa da AEL contou com outros três do mercado editorial carioca, os livreiros Ivan Errante, da Livraria Belle Époque, Ronaldo Ventania, da Hilário Livraria e Valentim Suburbano, da editora Oficina Raquel. Negro retinto, Machado de Assis, gigante da literatura nacional foi embranquecido pelo mercado editorial até ter o resgate da cor original no século XXI. Com esse retrato de nossa sociedade Ivan Errante abriu a mesa. Valentim Suburbano lembrou de Paula Brito, também negro, “Primeiro editor brasileiro digno deste nome”, segundo Machado de Assis, cujo primeiro livro foi editado por ele, precursor da imprensa negra no Brasil com o jornal O homem de cor, e dono, em 1848, da livraria Loja do Canto, no Centro. Em 2023, apesar do aumento recente, apenas cinco livrarias são de propriedade de negros no Rio com segmentação na cultura afro e, segundo Valentim o número de editores é muito pequeno: “ainda assim melhor do que há vinte anos”. Valentin apresentou no debate o livro Encruzilhadas Suburbanas, da editora Oficina Raquel, lançado este mês, com contos de vários autores sobre a diversidade cultural do subúrbio carioca, inclusive um assinado por ele. Outro livro exibido foi “A terra dá, a terra quer” de Antonio Bispo dos Santos, da Ubu Editora, leitura, na ocasião, de Ronaldo Ventania, da Hilário Livraria, sobre decolonização e cosmofobia: “o medo do cosmos que funda o mundo eurocristão monoteísta.” Inaugurada em 2022 na Saúde em área conhecida como Pequena Africa, a Hilário é a segunda experiência de Ronaldo como livreiro que, depois do sebo Sábias Palavras, na Lapa, transita para a venda de novos com ênfase em religiosidades de matriz africana. Para quem trabalha com usados, fica difícil manter um acervo voltado para a cultura afro, explica Ivan, porque o aumento da produção nesse setor é recente. O que entra sobre religões africanas sai rápido sem tempo de montar uma seção, acrescenta Ronaldo. A Belle Époque, de Ivan, ganhou fama nacional ao ser destruída por um incêndio, em 2022, e reinaugurada este ano no mesmo local no Méier. Depois de trabalhar em livrarias tradicionais do Centro como a Leonardo da Vinci e Berinjela, Ivan nota que a presença do público negro ainda é reduzida. Na plateia Borgópio D’Oliveira, da Triuno Livraria, presidente da AEL, corroborou o que foi dito na mesa e lembrou já ter sido vítima de preconceito em livraria onde lhe foi dificultado o acesso à informação por um segurança da loja. Ele, como os outros integrantes da mesa, gostou do desenvolvimento do ´tema, do interesse da plateia, e o fato de haver a predominância de negros na mesa: “um grande avanço”.
Kleber Oliveira 11/9/2023 |