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O papel da Convenção

 

Carta entregue ao presidente Lula  pela regulação do mercado livreiro idealizada no primeiro dia da Convenção  Nacional de Livrarias mostrou o evento como lugar  de encontros, debates e também oportunidade de ação.

 

32ª Convenção Nacional de Livrarias: O valor do livro - @gagomelofotografia


“Estamos em um momento crucial para o mercado brasileiro de livros. Questões que, se conduzidas com bom senso e seriedade, permitirão que, em 50 ou 100 anos, profissionais do livro olhem para trás e digam: aqueles dias mudaram a nossa história.”

A afirmação do presidente da Associação Nacional de Livrarias, Alexandre Martins Fontes, abriu a 32ª Convenção Nacional em São Paulo terminada na quinta, 5. Neste dia, a carta assinada pelas entidades do livro sobre a urgência de aprovação da Lei Cortez  foi entregue ao presidente Lula na abertura da 27ª Bienal do Livro de SP.

Como de costume, a  Convenção  acontece dois dias antes da Bienal e este ano, ao contrário das edições anteriores, que em geral são em hotéis da capital paulista,  ela foi realizada no Parque Anhembi onde centenas de operários e profissionais do livro preparavam a inauguração da Bienal.

O gigantismo da feira em torno do livro criou clima adequado para a Convenção, em edifício anexo ao parque de exposições do Anhembi e, ao mesmo tempo, evidenciou a fragilidade do varejo na cadeia nacional do livro: apenas cinco livrarias participam da Bienal, que conta inclusive com estande da Amazon.

Fortalecer as livrarias é o principal objetivo da Lei Cortez, que propõe prazo de um ano para que lançamentos tenham o mesmo preço em qualquer canal de vendas e acaba com descontos indiscriminados. Sua aprovação é a principal meta de Alexandre Martins Fontes na presidência da Associação Nacional de Livrarias, que organiza  a Convenção.

No segundo debate ele  disse ter participado de um jantar, em petit comité com o Ministro da Fazenda, Fernado Haddad, para falar  sobre o projeto de lei: " Fiquei super feliz com a reação dele, que entendeu imediatamente o que nós estamos fazendo.”

“Alexandre é o cabo eleitoral da Lei”, disse Mara Cortez, no intervalo dos debates.  Filha do livreiro e editor  José Xavier Cortez, falecido em 2021, que dá nome à lei,  a  também livreira e editora está otimista: “Precisamos que essa guerra seja um pouco mais leal”

Mara disse que em outubro a Livraria Cortez, fundada em 1980 no bairro de  Perdizes, em São Paulo, será reaberta: “Em 2016 ela foi fechada por causa da crise. Será uma livraria para o bairro com todos os tipos de livros. Apesar de antes trabalharmos com tudo,  tínhamos um viés mais acadêmico, por estar do lado da PUC”.

Experiências  de sucesso com leis similares  à Cortez foram descritas por  Marion Loire, biblioteconomista da Embaixada da França, que falou sobre a versão francesa, Lei Lang,  em vigor há 43 anos,  e Guido Cervetti, da distribuidora argentina Big Sur, que falou da  Lei de Proteção à Atividade Livreira, aprovada há 23 anos no país dele.

Guido disse que todo o mercado respeita a lei e que, lá,  existem  questões já resolvidas aqui, como metadados: “Na Argentina não há um sistema unificado de informações. Cada livreiro carrega manualmente os livros no sistema. Nisso estamos muitos anos atrasados.”

Segundo ele,  a qualidade dos livros no Brasil  é superior pois na Argentina não existe capa dura, só há um tipo de papel, “caríssimo, dominado por um cartel”.  Mas, mesmo com a nossa qualidade, expositores na Convenção mostraram que os livros brasileiros são os mais baratos do Ocidente.

Os únicos  livros vendidos no evento foram duas obras dos dois convidados da área musical que falaram sobre o trabalho deles de composição e na área editorial: Fernanda Takai, do grupo mineiro Pato Fu, e Nando Reis, ex-integrante do grupo paulista Titãs.

O último  livro infantil de Fernanda, Quando Curupira encontra Kappa - ilustrações de Daniel Kondo -WMF Martins Fontes, lançado em 2023,  tem trama que junta personagens das mitologias brasileira e nipônica em 33 páginas e era vendido a R$ 89,00.

Vânia de Figueiredo da editora carioca Valentina, comprou um exemplar para o neto Benjamin de 7 anos: “Está na cabeça da gente que o livro é caro. Muitas vezes vou comer,  gasto R$140 e não acho caro. Esse livro tem o papel colorido, autor, ilustrador, tradutor, porque é bilíngue, com uma versão em japonês abaixo do texto em português. Meu neto adorou; ele tem loucura pelo Japão.”

Uma dúzia de editoras montaram estandes para expor novidades aos livreiros no espaço onde aconteceram as pausas para o café e entre eles estava o da Transpo Express,  que se especializou no frete de livros e, segundo Mariana Martins, mobilizou 20 carretas para a Bienal  onde se lê nas carrocerias “transportando sonhos e conhecimento através dos livros!”

Cientes do valor do livro, os 300 inscritos na Convenção, ganharam obras que iam dos clássicos Totem e Tabu, de Sigmund Freud -  Edipro,  A Mulher Independente, de Simone de Beauvoir – Nova Fronteira, à novidades como Os Quatro papéis, de Yuri Trafani – Citadel e Cura energética, de Oliver Niño – Mantra.

O evento teve participação dos principais nomes das livrarias brasileiras como Marcus Teles, da Leitura, Rui Campos, da Livraria da Travessa, Samuel Seibel, da Livraria da Vila e novos livreiros como Pedro Gama, 29 anos, que abriu em 2023, em Belém, PA, a Travessia Livraria.

Quase homônima  da rede carioca,  batizada em função da primeira loja na Travessa do Ouvidor, Centro, a livraria belenense homenageia em seu nome, segundo Pedro, o clássico Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, que termina com a conclusão do narrador Riobaldo: "O diabo não há! É o que eu digo, se for... Existe é o homem humano. Travessia.”

 

Kleber Oliveira

9/9/2024