Mobilização Tenta Evitar Fechamento da Camões Imprimir E-mail

Intelectuais, escritores e leitores se mobilizaram para tentar reverter a decisão do governo português de fechar a Livraria Camões. Uma petição pública na internet já tem mais de 900 assinaturas e um abaixo assinado de escritores portugueses já reúniu 60 nomes.

 

José Estrela: 'Somos finitos. Defendo o espaço.'

José Estrela: 'Somos finitos. Defendo o espaço.'

 

Há 40 anos no Rio, a Camões, se fechar, vai deixar órfãos os amantes da cultura lusitana. O gerente, José Estrela, diz que ficará viúvo pela segunda vez: "Sinto-me como se estivesse ao lado de um defunto em uma capela mortuária onde as pessoas se apresentam para dar os sentimentos".

Nesta quarta feira, 18, a Camões promoveu o Porto Amigo, um fim de tarde regado a vinho do Porto, cavacas e pães de ló, para agradecer aos clientes e amigos que durante anos prestigiaram a casa e que nos últimos dias visitam a loja para confirmar a notícia do fechamento.

"A livraria sempre foi muito acolhedora. As pessoas entravam por entrar. Só para ter o prazer de ouvir o meu pai falar sobre a literatura portuguesa", lembra Madalena, filha de José Estrela, e ex-funcionária da Camões.

A livraria foi inaugurada em 1972 e dois anos mais tarde, no dia 19 de março, dia de São José, José Estrela entrou pela primeira vez na loja onde está até hoje aos 76 anos. "Não defendo o meu cargo. Somos finitos." , diz ele, "Defendo o espaço".

"Portugal nunca teve uma política cultural digna desse nome no Brasil", diz o escritor Vasco Graça Moura, em artigo publicado no jornal português Diário de Notícias, no último dia 18, com o título "A Livraria Camões".

Para ele, a livraria ainda era a "âncora possível para muitas coisas ligadas à cultura portuguesa, na falta das políticas que deveriam sê-lo". E destaca a importância do gerente José Estrela "mexido e desenrascado", "com um talento fora do comum para as relações humanas".

Foi na Camões que o escritor José Saramago lançou seu primeiro livro no Brasil. Mas, diversos autores brasileiros também fizeram lançamentos ali e Estrela diz que jamais recusou um livro de autor brasileiro. Achava que não tinha o direito de fazê-lo e os aceitava em consignação.

Os livros do acervo já estão sendo vendidos com desconto e Estrela admite que no ano passado a Imprensa Nacional - Casa da Moeda, editora do governo português que administra a livraria, não exportou nenhum livro para cá, possivelmente já com a decisão tomada sobre o fechamento.

Estrela lembra que houve época em que os livros foram o principal artigo de exportação de Portugal para o Brasil. De 1984 a 1986, ele importou uma média de 60 mil livros por mês, principalmente com destino aos estados da região sul. Chegou a representar 114 editoras.

No Rio, um dos destaques na defesa da Camões é a professora da UFRJ Gilda Santos, vice-presidente do Real Gabinete Português de Leitura. Segundo ela, tirando o azeite e o vinho, Portugal tem pouco a exportar; seu grande potencial é a cultura, a língua.

A Presidente da Academia Brasileira de Letras, Ana Maria Machado, manifestou a esperança que a decisão de fechar a Camões possa ser revertida. Milena Duchiade, diretora da AEL, lembra que a livraria sobreviveu ao regime militar brasileiro, ao salazarismo, a hiper-inflação, e agora ameaça sucumbir diante da crise européia.

A petição publica que reúne mais de 900 assinaturas e pede a reavaliação da medida do governo português de fechar a Camões pode ser acessada pelo site www.peticaopublica.com.br/PeticaoAssinada.aspx?pi=camoes.