Israel Pedrosa – pintor, escritor, livreiro |
As cores e os livros Ele foi diretor da EDIL, distribuidora de livros do Partido Comunista e escreveu um livro fundamental sobre a teoria das cores.Vê o quadro em que Van Gogh retrata dois livros em cima de uma mesa como a mais importante natureza morta da história da arte.
Cópia feita por Israel Pedrosa de Natureza Morta com Bíblia, de Van Gogh - foto Samille Reis
Autor No bem montado atelier, na casa em que mora no bairro de Icaraí, Niterói, os livros disputam espaço com os quadros. Pintor desde cedo, foi aluno de Portinari aos 16 anos, e desde então tinha interesse por questões teóricas da arte. Portinari notou que o interesse do aluno ia além da pintura de paisagens: “Ele era muito inteligente e quando começou as aulas me perguntou: “Sabia que o preto na sombra é mais claro que o branco no escuro?” A pesquisa sobre cores fez de Israel consultor da TV Globo quando a televisão a cores chegou ao país. A Escola de Samba Unidos da Tijuca o homenageou, no carnaval de 86, no enredo “De Cabral à Bienal no país do Carnaval”sobre a história da arte no país. O livro “ Da cor à cor inexistente” lançado em 77 com o resultado de suas pesquisas está na 12ª edição e é obra básica no ensino superior: ” Nele fui capaz de mostrar como uma cor se altera ao lado da outra e em que percentagem”. As pesquisas de Israel sobre a “gramática das cores” repercutiram inclusive nos meios científicos. Depois lançou dois outros livros, “O Universo da Cor”, em 1986, que está na 6ª edição e “O Brasil em cartas de Tarô” , com edição única em 1991. O primeiro foi encomenda do Senac e o segundo um livro de arte onde as cartas do Tarô são representadas por figuras da cultura nacional. O padre Anchieta é O Eremita, o filólogo Antonio Houais é O Sol e , é claro, Tiradentes como O Enforcado. Israel Pedrosa não é esóterico , o livro foi influência do filho, iniciado no Tarô. Também não pretendia ser escritor. Escreveu “...a Cor Inexistente” por ser mais prático do que as inúmeras palestras sobre o assunto, que lhe tomavam muito tempo. Mas adquiriu gosto pela coisa. Há 18 anos está escrevendo o livro “10 aulas magistrais”. Nele, além de analisar a obra de dez mestres da pintura como Da Vinci,Van Gogh e Bosch,copia os quadros de todos eles para ilustrar a obra. Quando o livro for lançado será feita uma exposição com as pinturas copiadas no tamanho original. Ele foi à Itália só para conhecer a cópia do mural , a Batalha de Anghiari, pintado por Da Vinci, que existiu por 50 anos em Florença.
Israel Pedrosa e a cópia que fez de A Batalha de Anghiari, de Da Vinci, para o novo livro
Leitor “Tenho paixão pelos livros”. Embora a maioria dos que possui seja sobre arte, Israel Pedrosa também tem interesse em filosofia , história e política. Tira da estante um volume grosso em francês dentro de uma caixa e mostra com satisfação. “São análises filosóficas das obras de Balzac. Sabia desse livro desde jovem mas não tive oportunidade de comprar.” Recentemente o reviu no catálogo da Livraria Leonardo da Vinci e comenta com conhecimento de causa.a qualidade do papel. Desde a juventude, Israel Pedrosa tem o hábito de fazer a lista dos livros que pretende ler a cada ano, embora no decorrer dos meses entrem outros títulos. Continua sendo assim, mas hoje os livros que escolhe estão relacionados ao que está escrevendo. “Para escrever sobre Hieronimus Bosch, por exemplo, leio sobre a Idade Média, a Antiguidade Clássica”. Mantêm o hábito de juventude de dedicar diariamente 3 a 4 horas à leitura de livros. Internet não usa há 3 anos , acha que vicia um pouco. Também não gosta de visitar museus ou ver obras de arte pela internet porque, para ele, a qualidade da imagem é muito ruim e, quando é apaixonado por uma coisa só se satisfaz com a qualidade máxima. O tamanho reduzido das obras também não o atrai. A equipe de ajudantes pesquisa na internet o que lhe interessa para fazer a revisão do que escreve: “Na revisão quero saber, por exemplo tudo que aconteceu nesses últimos anos publicado na Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, sobre o Bosch”. Um dos livros que consulta e considera fantástico é o que traz em três volumes a correspondência completa de Van Gogh, publicado no ano do seu centenário: “Em vinte anos li de ponta à ponta várias vezes.Vem com os desenhos, é um tesouro”. Israel Pedrosa assinala a importância dos livros na vida de Van Gogh.Em uma das cartas o pintor holandês pede ao irmão Theo que no lugar do dinheiro para comer lhe envie um livro que fala sobre cores. Meses depois diz que o livro o fez ver mais cores. O quadro “Natureza morta com a Biblia”, de Van Gogh, é tido por Israel como a mais importante natureza morta da história da arte. Nele estão pintados uma Bíblia majestosa e abaixo uma edição gasta de “Joie de Vivre” (Alegria de Viver) de Zola. Para Israel, o quadro mostra a tensão entre o pai de Van Gogh, pastor protestante, simbolizado pela Bíblia, e o filho com quem rompeu por causa da vida que levava entre desvalidos e prostitutas, representado pelo livro “Joie de Vivre” de Zola Israel explica que, numa conversa em que o pai questiona sobre o dinheiro que dá a Van Gogh, este diz; “ Cristo não disse que somos todos iguais.Você acha que vou comer com esse pessoal todo na miséria ao meu redor?” Aí se dá o rompimento. Israel Pedrosa vê a obra como a mais importante natureza morta não pelo valor de mercado, mas pela história humana por tráz dos dois livros pintados: “Penso assim por causa do meu amor ao livro, o meu amor por Van Gogh e pelo ser humano”.
Livraria Hoje Israel Pedrosa não frequenta livrarias. Vive recluso no atelier concentrado em terminar o livro “10 aulas magistrais”. Sua equipe pesquisa o que lhe interessa pela internet e o mantem informado sobre lançamentos das editoras . Mas estranha a diminuição do número de livrarias; ” por que o livro impresso continua com uma produção muito grande. Nas bienais do livro, os kits com os catálogos de lançamentos são enormes”. Diz que a Internet está influenciando a mudança. “ Não é uma crise do livro impresso. É uma crise de circulação. Que existe desde os tempos de Monteiro Lobato. No prefácio de um dos livros das Obras Completas ele fala sobre isso. Monteiro Lobato teve de criar sua própria editora “. “As grandes empresas europeias estão vindo para cá e se associando às editoras, em negócios de milhões. Antes havia um número maior de livrarias do que de editoras. Hoje as editoras vendem pela internet e aí já começa a resposta”. Na década de 50 Israel Pedrosa foi diretor da Edil, Empresa Distribuidora de Livros, criada para distribuir os livros da Vitória, a editora do Partido Comunista, que também tinha grande dificuldade de circular sua produção. “A história da editora está ligada ao partido. Os golpes contra o partido eram voltados contra ela. A Edil surgiu em 1954 porque havia uma grande popularidade das idéias democráticas. Foi um período muito rico de experiências.” Naquela época, o Partido Comunista teve 38 livrarias no país e, no Rio, a Livraria Independência, na rua do Carmo, era a mais moderna da cidade A nova política era apagar a imagem de clandestinidade e atrair a classe média e o meio estudantil. A Edil distribuía não só a produção da Vitória mas também livros editados em português e espanhol na China e União Soviética. Segundo Israel, obras em francês também tinham grande aceitação no meio estudantil, que era bastante politizado. “O jovem de hoje não tem como entender o panorama cultural daquela época. Todos os grandes intelectuais ou eram do Partido ou eram aliados. O que se colocava era a questão da independência do Brasil e a ruptura com o capital estrangeiro.” “As discussões internas do Partido eram sobre como popularizar o livro, como colocar as obras de divulgação marxista ao maior alcance possível. A grande inovação que criamos para colocar o livro na rua foi a primeira feira do livro na Cinelândia em 54”. “Ela só funcionava na Cinelândia e era inaugurada no dia 18 de abril, dia do aniversário de Monteiro Lobato. Os estandes eram muito bem montados. Era uma atração para o movimento estudantil, para a classe média. As livrarias maiores acabaram aderindo.” Israel Pedrosa explica que o objetivo principal da feira era divulgar textos que ainda não eram editados no Brasil com as idéias democráticas e marxistas. Com a crise na União Soviética em 56, no entanto, o Partido Comunista, no Brasil começou a rachar. “ A força motriz da Feira do Livro era o partido comunista que se repartiu em várias facções. Foi quando eu também me desliguei da editora.” Segundo ele, sem o PC como fiel da balança, a feira foi perdendo o interesse e começou a degenerar. “ Foi mais ou menos no período em que a feira passou a ser comandada pelos donos de sebos. Como ninguém se interessou em permanecer, aqueles que conseguiam uma mini sobrevivência continuaram levando adiante. Mas não atrai o público que atraia.” Com a ruptura ideológica, o braço editorial do Partido Comunista não resistiu e também entrou em crise levando ao fechamento da editora Vitória, da Edil e da Livraria Independência que sobreviveu até o início da década de 60. Israel Pedrosa foi trabalhar em uma agência de publicidade e garante que não houve contradição com o que fazia antes. Segundo ele era uma agência que defendia os interesses nacionais como na questão do Petróleo. Garante que tirou o melhor de tudo que fez na vida. Até da Segunda Guerra Mundial onde se alistou como voluntário. Alí, teve contato com guerrilheiros italianos que lhes apresentaram as idéias políticas que nortearam sua vida. |