Somos uma classe resistente Imprimir

A 23ª Convenção Nacional de Livrarias, realizada no Rio na última semana de agosto, com profissionais de norte a sul do país mostrou diferentes visões do mercado. A Convenção comemorou os 35 anos da Associação Nacional de Livrarias, organizadora do evento, que este ano teve apoio institucional da AEL.

 

Livreiros no painel “ Cenário atual de livrarias de Norte a Sul” falam do mercado regional

Livreiros no painel “ Cenário atual de livrarias de Norte a Sul” falam do mercado regional

 

Os dois dias de convenção, um de chuva, outro de sol, em um hotel cinco estrelas na Praia de Copacabana, mostraram que há nuances no cenário do mercado livreiro, dito em crise. Existem os apocalípticos que apostam no fim das livrarias, como são hoje , mas há os que veem a nova realidade como oportunidade de evolução.

Logo no primeiro debate, mediado pelo presidente da ANL, Ednilson Martins , foram expostas visões diferenciadas sobre o tema “ Prepare sua livraria para a evolução”.entre Marcus Telles, da Leitura e Antônio Carlos de Carvalho, da Galileu.

Marcus Teles revelou que o livro corresponde a 49% do faturamento em suas 42 lojas e o restante é gerado por outros produtos. Já Antônio Carlos de Carvalho garantiu que em suas 3 lojas não é vendido um lápis sequer.

Marcus está fechando seu site enquanto Antônio Carlos considera o da Galileu uma quarta loja e diz que ele vai crescer. Entusiasmado com os benefícios do programa de gerenciamento de livrarias desenvolvido por sua equipe, abriu a Galileu Soft para comercializá-lo junto a outras livrarias interessadas em modernização.

O dono da Leitura disse que negocia com as editoras os mesmos descontos que estas dão as suas concorrentes. Já Antônio Carlos acha que os descontos devem ser iguais para todas livrarias sem prestigiar nenhuma e revelou ter recusado uma venda recente em que uma editora lhe oferecia desconto de 50%.

Mas se os modos de evolução variam, o inimigo é comum: editoras sem ética que vendem direto nas escolas ou através de sites, ou fornecem para empresas em que, segundo Antônio Carlos, o livro é um “boi de piranha” vendido a preços irrisórios a fim de atrair o cliente para compra de eletrodomésticos.

Ednilson Martins disse que é preciso que o editor entenda o papel social do livreiro e que apesar do cenário ser preocupante e delicado as livrarias não vão acabar. ” Há esperança. Somos uma classe resistente”.

Um sinal de tempos melhores foi a assinatura do decreto do Vale Cultura pela presidente Dilma Rousseff enquanto acontecia o primeiro dia da convenção. O vale será mensal e cumulativo no valor de R$ 50,00 para trabalhadores que ganham até 5 salários mínimos. Muitos livreiros esperam vê-lo trocado por livros principalmente onde há pouca oferta cultural.

Entre outros temas , a convenção discutiu a moralização do mercado, marketing para pequenas e médias livrarias, a alavancagem na venda de literatura infanto juvenil e houve um debate sobre o vale cultura e as políticas públicas para o segmento livro.

Milena Duchiade, da Leonardo da Vinci, reclamou no paínel sobre as livrarias de norte a sul que o governo prestigia as grandes redes em detrimento das pequenas. Disse que uma única rede recebeu do BNDES um financiamento de 28 milhões de reais, metade do valor que o governo francês distribuiu para mais de 450 livrarias naquele país.

Antonio Bentes Vale estava na convenção vindo de Boavista capital de Roraima, onde além da sua livraria, a Saber, existe apenas uma franquia da Nobel e uma farmácia que vende livros. Ele entrou para o ramo em 2009 ao adquirir a loja de uma franquia da editora católica Vozes.

Desde então já participou de três convenções da ANL e diversificou o acervo que segundo ele vai da umbanda ao comunismo. Sua preferência é a fotografia, mas o forte da loja são os livros de direito que lhe permitem continuarcom livros de fotos que vendem em média um por mês.

Antonio, que também fez alguns cursos da ANL, diz que seu trabalho como livreiro é social, não comercial. Segundo ele isso inclui apoio a novos autores e implantação de bibliotecas em comunidades indígenas.

Outra com visão social é Maria Nadja Nunes Bittencourt que veio de Salvador representando a livraria da Eduneb – Editora da Universidade do Estado da Bahia. Como recebe recursos públicos, diz não ter preocupação com o lucro, mas sim de formar o leitor científico e inibir a política da fotocópia tão comum nas universidades.

Acompanhada de uma assessora de imprensa veio para aprender técnicas de marketingpara divulgar melhor seus livros. Disse que em breve serão inauguradas 22 novas livrarias em campus universitários da Bahia.

Anexo ao salão da convenção foi montado um outro salão chamado de Rodada de Negócios onde as editoras que deram apoio ao evento exibiram estandes com as novidades. Enquanto isso, representantes de pequenas editoras circulavam pelo evento fazendo contato com os livreiros.

Durante a convenção foi redigido o manifesto pró livro, chamado Carta do Rio, em que os livreiros exigem a imediata interrupção do comportamento antiético, ilegal e predatório de algumas editoras. O documento, distribuido para a imprensa, pede uma política de estado que reconheça o papel social da livraria e sua importância na bibliodiversidade.

A 23ª Convenção Nacional de Livrarias mostrou também que as novas tecnologias vão demorar a fazer diferença por aqui. Hoje o livro digital ocupa apenas 0,5 % do mercado. Cada um dos mais de 200 participantes inscritos foi brindado pelas editoras com pesadas sacolas com livros e catálogos e ninguém ganhou livro digital.

 

Livreiros confraternizam no coffe break da convenção e fazem novos contatos profissionais.

Livreiros confraternizam no coffe break da convenção e fazem novos contatos profissionais.