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Militante desde sempre


Solange Whehaibe

Proprietária da Veredas, primeira livraria da cidade de Volta Redonda, sul do estado, ela também é uma das fundadoras da AEL. Considera os livreiros uma classe especial e abomina palavra book em nome de livraria ou atividade ligada ao livro. Aqui, Solange fala também da biotipologia,uma  alimentação restritiva que adotou há anos.

 

 

AEL

A AEL foi fundada em 1993, mas alguns anos antes houve um ensaio de fundação de uma associação com uns livreiros bem tradicionais aqui do Centro do Rio. Naquela época a Veredas já tinha nascido. Como não sou do Rio, vinha todas as semanas de carro buscar os pedidos. Em cada editora que passava, encontrava um ou outro livreiro e sempre havia uma conversa. Nesse período conheci a Derly, do Bazar  Cerejinhas e o Paulo Roberto, da Livraria Obelisco, de Petropólis. A Vânia, da Livraria Eldorado, eu já conhecia. Então começamos a pensar na idéia de nos reunir, fazer Bolsa de Troca, principalmente do livro escolar que sobra e a regra de troca é muito perversa por parte das editoras. Conseguimos fazer uma reunião onde era a editora Brasil America em São Cristovão. O Paulo, que era o editor, nos abriu as portas, ofereceu almoço. Veio também a Esther, da Casa Mattos, e o grupo ampliou um pouquinho. Depois, ao longo de outras reuniões, resolvemos fundar a Associação de Livrarias para tentar ter força. Nas editoras a gente parava e conversava. Conhecia até os motoristas das livrarias.. Os editores cediam o espaço para que nos reuníssemos, como o da Ática. A cada reunião havia entre 5 e 10 livreiros. Não é pouco. Se pensarmos que hoje são 50 livrarias associadas, 10 pessoas são 20 por cento. Não é pouco. O Paulo Roberto era muito animado, foi o primeiro presidente. Depois veio o Jack London, que não pode ficar porque deixou de ser livreiro e assumi no lugar dele. Naquela época quase que a associação foi extinta. Teve uma livreira que chegou e bancou dizendo que não deveríamos deixar que isso acontecesse. Nesse período, que eu reporto a 99, os livreiros independentes do Rio começaram a se reunir e ficaram na dúvida: entram para a associação que existe ou criam outra. Mas tiveram o bom senso de se juntarem a nós. Então ficamos fortalecidos com a entrada desse grupo. Entre eles estavam o Ítalo e a Milena ( Leonardo da Vinci). Eles nos procuraram. Nesse mesmo ano aceitei a presidência, mesmo sendo de fora, porque acho que o compromisso político nosso é muito grande. Manter uma entidade no nível que estava até chegar ao nível que está hoje. Foi uma credibilidade: “Vamos crescer, vamos aparecer um dia”. A coisa andou de tal forma que hoje, pela quinta vez, são as livrarias filiadas à Associação que trocam esse voucher de 50 reais que a Prefeitura distribui para os professores. Isso realmente faz com que a gente apareça e que todos saibam que a associação existe. Para mim não foi o fato de ter sido presidente, mas o compromisso de manter a associação viva para chegarmos onde estamos hoje. Teve uma época em que nós acampávamos em uma sala da Livraria Leonardo da Vinci. Pagávamos uma parte da despesa. Ou nos reuníamos na Livraria da Travessa.  Dávamos um jeito. Ficamos também um tempo na sede de uma Associação de Papelarias, na Avenida Gomes Freire. Depois o Marcos,  Argumento, foi presidente, a Milena o sucedeu. Acho que fazer um trabalho bom na presidência é se posicionar. Ter posição firme a favor das livrarias. Os editores são muito fortes e nós não podemos nos acomodar. Temos de enfrentá-los. Nosso grande desejo é a lei do preço único. Mas um pequeno grupo dos mais poderosos não admite e a coisa não anda. O México avançou mais que nós, a Argentina. Fora a França e outros países da Europa. Mas nisso eles não querem imitar os europeus. O poder é deles e acabou. Ainda não perdi a esperança. Fiz a ata de fundação da nossa associação e estou aqui até hoje. Tem 19 anos. Para mim ainda é possível e vamos continuar lutando pela lei do preço único. Tenho impressão que o Sindicato dos Editores nunca fez uma pesquisa com todos os filiados sobre a lei do preço único. Resolvem em  nível de diretoria. Mas muitos são a favor, temos assinaturas. É uma minoria que não quer. Mas são os mais fortes. O pessoal do sul fez um documento fantástico defendendo a lei. Perfeito, não tem como alguém questionar. Acho que falta algo como conquistar os intelectuais, as pessoas que têm acesso à mídia. Grandes escritores, se fossem contatados e conscientizados da importância dessa lei, talvez nos apoiassem. Tem que ter mobilização. Tem de ter lobby. Mas quando chega em Brasília a coisa não anda. Já procuramos o Senador Sarney, que é da Academia, que é escritor. Mas algumas vezes nem resposta do gabinete a gente consegue. Isso para eles não tem significado, não vai trazer votos. Mas acho que a AEL avançou muito nesses 19 anos. Temos sede própria, mais de 50 associados num estado que não tem muitas livrarias. O Brasil tem poucas livrarias. Mas ainda temos de mostrar a muitas livrarias que a associação existe. Fazer um trabalho de convencimento para que se associem. Mostrar que existe, que tem uma sede própria, que luta pelo livreiro. É uma luta política, ideológica. Como o país vai viver sem livrarias? As pessoas vão comprar pela internet sem ter uma livraria para sentar, para ter um debate. Hoje no Brasil o papel da livraria mudou completamente. Também participo da ANL. Mas nessa última diretoria não entrei. Colocaram mais gente do Rio. Por 4 mandatos fiz parte da diretoria  como vice- presidente regional e como membro do conselho fiscal, onde entrei primeiro. Cheguei a ir à Palmas (TO) representando a ANL. Lá em Volta Redonda entrei recentemente na diretoria do Sindicato do Comércio. Quero ver como isso funciona por dentro. Sou da diretoria da Casa da Criança e do Adolescente (Pastoral da Criança), como voluntária. Faço um monte de coisas, mas de livrarias é a AEL e ANL. Porque os livreiros não participam de outras entidades. Com o Sindicato do Comércio tive uma experiência no ano passado quando eles promoveram em Conservatória uma reunião das diretorias dos sindicatos do Rio. Foi interessante. Tem a parte social , mas também palestras e oficinas. Este ano , fui a Natal, em maio  agora, em um evento de nível nacional. Houve muitas palestras interessantes com exemplos de vencedores da região. Palestra com o ministro Garibaldi Alves (Previdência Social):  falou com o coração e com a política. Mas não existe livreiro aí. Nem na diretoria, nem participante. São outras atividades de comércio que participam. Não é fechado. O livreiro é que não vai.

Veredas

Volta Redonda está no sul do estado, a cem quilômetros do Rio. Estou lá há 50 anos. Finqueis raízes  e, ganhei o título de cidadã voltarredondense. Sou natural de Muqui, uma cidadezinha do Espírito Santo, ao lado de Cachoeiro do Itapemerim. Em Volta Redonda sou pioneira no ramo livreiro. Existem as papelarias que vendem principalmente o livro  didático, umas até com 40, 50 anos. Nós nos propusemos a abrir como livraria. Foi em 1981: eu e duas amigas. Uma era cunhada, que já faleceu e a outra saiu da sociedade. Como não posso ser dona sozinha, hoje tenho uma sobrinha com um percentual. Na época da inauguração nós vendíamos posters, discos independentes (comprados no Rio e em São Paulo). Como antes não havia livraria em Volta Redonda eu supria minha necessidade de livros vindo ao Rio onde comprava muito. Lembro também de comprar por catálogo.  Antes não se via necessidade do livro. Hoje tem a Veredas, tem uma livraria universitária, que trabalha muito com jurídico, e abriu uma franquia da Nobel há uns dois meses. Hoje há espaço para livros na cidade, mas na década de 80 não se falava disso. Nós abrimos a livraria em um subsolo no bairro que é o ponto máximo do comércio na cidade: Vila Santa Cecília. Tudo acontece lá. Abrimos no subsolo de um prédio onde iria ter um teatro. Consideramos que ali era um mote muito interessante, teatro, livraria, exposição, um centro cultural. Abrimos em novembro, totalmente crus. Em dezembro foi lançado “A Guerra do Fim do Mundo”, do Mário Vargas Llosa e me lembro que vendemos 12 livros. Para nós foi um fenômeno, uma livraria com um mês.  E não era um livro barato. Foi muito bom.No começo não havia interesse em vender livros didáticos, começamos com os paradidáticos. Os professores procuravam e a livraria foi ficando mais conhecida. Começamos a levar autores, Orígenes Lessa, Ana Maria Machado e fomos promovendo atividades. A livraria foi ficando conhecida ao ponto de sermos empurrados pelos clientes a trabalhar com livro didático. Então nove anos depois, no fim dos anos oitenta, começamos. O nome foi se consolidando e hoje a Veredas é referência na região. Tiramos o nome do livro “Grande Sertão Veredas”, de Guimarães Rosa. E tem todo o sentido do que são veredas, caminhos, atalhos. Tudo leva à cultura, à imaginação. Por sorte não colocamos book de nada. O nosso é bem brasileiro. Mas eu não tinha conhecimento de Guimarães Rosa. O nome foi escolhido pela fama do livro e pelo significado da palavra Veredas. Hoje leio muito mais. Eu era professora de matemática. Dava aula o dia inteiro. Tinha que cuidar da livraria. Hoje me esforço para saber o que tem no mercado e leio algumas coisas que gosto. Gosto de filosofia, de romance, de política. Não gosto de terror. Gosto bastante da não ficção. Acho as biografias interessantes, como "Olga". São livros marcantes até para você entender a história do Brasil, como “1968”. Lembro-me como, na época, vendia o livro "A Ilha", do Fernando Moraes. Nós pegamos a abertura política. Então vendia Marx, vendia Martha Harnecker.  Pegamos essa fase da vida brasileira, da abertura. Vendi centenas de bottons do movimento das Diretas Já. Até hoje qualquer coisa que as pessoas pensam alternativamente, procuram a livraria, porque criamos esse perfil. A gente garimpava tudo. Tinha uma loja na Avenida São João em São Paulo, numa galeria onde comprava discos do Itamar Assunção,do Elomar. É uma coisa minha esse mote da cultura. Gosto muito. Não sei se foi a educação de escola do interior onde a gente declamava, cantava, desfilava, participava muito. Isso formou a minha cabeça intelectual. Vinha muito para o Rio e assistia  peças, shows,  tudo que se pode imaginar. Ia sozinha se fosse o caso. Mas não perdia. Hoje como não tenho mais casa no Rio, perco algumas coisas. Não tinha os problemas de segurança que tem hoje. Andava sozinha de carro para todo lado e não tinha perigo. Hoje já é um risco. Convivia com os jovens. Levava meus alunos para todo lado, para Belo Horizonte, para Ouro Preto, Niterói, Caxambu, Petrópolis. Falava a linguagem deles. Quando abri a livraria foi a oportunidade de oferecer essas coisas. E o próprio cliente, quando pede, já está sabendo que somos capazes de atender. Na área de discos tínhamos só os alternativos. Na área de livros temos de quase tudo. Também começa a aparecer o espaço para o autor local,  mas aí é o alternativo. Porque o alternativo do Rio não chega até lá. Mas o que é de lá e escreveu um livro de poesias, você faz o lançamento. Como fiz uma vez numa noite de dezembro, com chuva e o autor, Silvinho Poeta, vendeu quase cem livros. O público também te empurra. Mostra o que quer. A gente vendia pôster do Chaplin. Havia espaço para debates. Havia a abertura política e isso empurrava. Um dos primeiros debates foi sobre Consciência Negra com a Neusa Santos Souza que escreveu “Tornar-se Negro”. Isso construiu a imagem da livraria. Não foi só um espaço para você entrar, comprar o livro e ir embora. As pessoas ligavam e perguntavam; “Fulano está aí?” Porque sabiam que podiam encontrar lá. Marcavam encontro na livraria. Talvez até porque a cidade nunca tivesse tido livraria as pessoas passaram a se sentir representadas. Ligavam para tudo: “Qual o filme que está passando hoje?”. Porque o cinema era no mesmo prédio. Fizemos uma coisa muita aberta. De levar música para lá também.

Ponto de Encontro

Hoje a Veredas continua um ponto de encontro. Tem a Cafeteria Diadorim. Os professores se reúnem para fazer planejamento. Tem gente que vai lá e usa uma mesinha para dar aula. As escolas promovem muitas visitas à livraria. Escolhem os livros antes, vão andando com as crianças pela rua. Quando entram no shopping, lá de cima, de dentro do escritório, já sei que eles chegaram. Porque é uma algazarra. Algazarra boa. Eles deitam e rolam. No aniversário da Revolução Francesa vamos fazer uma reunião com o pessoal que fala francês. Vamos para lá às cinco horas da tarde e vamos ter quiche francesa. As pessoas tem as idéias e o local é a Veredas. Nesse caso foi uma amiga que disse que está fazendo conversação e perguntou: “ Vamos juntar?”. Já avisei para todos que gostam de francês para irem para lá. Aí faço o movimento no café. As pessoas fazem um lanche. Uma coisa que fiz durante muito tempo foi o Café Filosófico. Tinha um professor que juntava as pessoas, ia para lá e debatia filosofia. Mas ele deixou de ser professor e estou para fazer outro grupo. Essa oportunidade que a livraria dá é incrível. Outro dia tinha três rapazes olhando a nossa parte de cima, ciências sociais, filosofia, história. Um deles veio e pediu para ver "Contrato Social", do Rousseau. Eu disse: "Ai que chique! Vai ler "Contrato Social" do  Rousseau”. Eles começaram a rir e eu disse: “ Onde vocês estudam?” Um falou: “ Não tem como a gente fazer umas reuniões aqui?" Um menino do ensino médio, de 16 anos. Eu disse: “ Vamos fazer a hora que vocês quiserem. Tenho um funcionário aqui que é formado em  antropologia e pode falar para vocês.”  Depois no outro dia um deles estava com a mãe na loja do lado e veio falar comigo. São oportunidades que estão nas livrarias e os editores não sabem disso. Não sabem a função social de uma livraria. Um dia eu quase chorei. Entrou uma moça e veio falar comigo: “ Eu vou fazer uma apresentação hoje e quero saber como se pronuncia o nome do autor”. Ela foi na livraria para perguntar isto. É de doer de emoção, de alegria. Saber que você é capaz de atender e de ser referência. Acontece de tudo.Um dia estou atravessando a rua e um menininho parou, me abraçou: “ Oi tia”.  Os pais ficaram olhando. Ele sabia quem eu era . Tinha ido na livraria com a escola. A sorte é que minha cabeça é muito boa e me lembrei. Porque como é que uma criança de 6 anos fica falando com quem não conhece. E outro dia ele estava na loja querendo mais livros, uma graça. Tenho uma relação maravilhosa com o público infantil. Sento na loja junto com eles. Tenho um acervo muito bom de livros infantis. Vim ao Salão do Livro Infanto-Juvenil só para pegar mais catálogos. Trouxe uma funcionária , passamos todos os estandes. Acho que é uma feira para vender para escolas. Mas tem muita coisa que eu não tinha conhecimento. Um acervo muito grande de livros ligados à questão do negro. Na livraria tenho uma mesa  para as crianças, toda colorida.Tem hora que eles destroem, de tanto abrir e fechar os livros. Não coloco papel para eles rabiscarem. Acho que ali é para ver o livro. Mas os pais têm comprado bastante livros para as crianças. A venda do livro infantil aumentou muito. Tem criança que foge da mão do pai e vai para a livraria e já sabe onde vai procurar. A gente quer investir mais nisso, aumentar o espaço. O juvenil também. A garotada está lendo muito. “Diário de um Banana”, como eles lêem aquilo, compram, compram. Imagino que a internet tire um pouco o público. Mas tem uma garotada que vai, tem os interessados. As TVs, não sei se é orientação do MEC ou do MINC, têm feito muita matéria sobre leitura para criança. Vão aos lançamentos. Ano passado teve dia em que foram quatro turmas de alunos à livraria. Quando olhei aquilo... Coloquei um grupo em um canto, outro na parte infantil e dois em cima, no café, um de cada lado. Quatro turmas, cada criança com um livro. Nós temos uma mídia espontânea muito grande também; jornal, quase toda semana, televisão. A TV Rio Sul, que é afiliada da Globo, toda vez que quer fazer matéria vai para a livraria. Essa semana apareci no "Bom Dia Rio". Sempre me entrevistam. Muitas vezes me ligam de véspera e dizem: “ Solange, quero fazer uma matéria amanhã com jovens que gostam de ler, você arruma? Agora quero uma família, agora quero crianças.” Sou eu quem arruma tudo e eles ficam lá esperando até a matéria ser feita. Agora tem um canal local que cobre todos os eventos. As pessoas passam e falam: “Te vejo na televisão toda hora”. É muito forte isso. Lançamos outro dia o livro do Roberto Salvador que é a história do rádio teatro. Saiu em tudo quanto é rádio, televisão, jornal. Não posso dizer que vendeu muito. Mas fizemos na cafeteria. As pessoas se juntaram, conversaram. Ele é do Rio e ficou muito feliz. Até ex-aluno dele compareceu. Tem um programa popular de manhã, muita propaganda, mas é ouvido. E Dário fez uma entrevista com ele. A cidade inteira escutou. As pessoas falavam: ” Ah , hoje tem lançamento!” Porque escutaram no programa.Quanto a lançamentos não é que não goste, mas tenho medo do público não prestigiar. Mas esses últimos têm sido ótimos. As pessoas têm vendido uma média de 70 livros. A divulgação é feita por todo mundo. Por quem está lançando e por nós. Às vezes peço ajuda de jornalistas e eles mandam para a mídia. Tem uma menina que lançou um livro de poesias e levou os músicos. Fizeram performance, declamação, leitura de poesia e por aí vai até 10 da noite. E toma um vinhozinho. O UNIFOA, um centro universitário, fez uma nova edição de um livro lançado por um médico, um  dos fundadores, e a Veredas foi a escolhida para o lançamento. Uma festa linda, com buffet, discursos. Festa badalada, com televisão, jornal. Mas o livro foi doado, não foi vendido. Mas agradeci, porque a pessoa vai para lá e consome, compra livros, toma café. Foi um movimento ótimo.

A Internet

Não me fale sobre novas tecnologias porque não vou responder. Tem uma semana que não acesso meu e-mail. Não dá tempo. Semana passada foi uma loucura. Para entrar numa licitação da prefeitura tive de ficar dois dias preparando. Eram trinta e poucos lotes. Tive de colocar preço, negociar com as editoras mais desconto, preparar a documentação e ir para lá, o que tomou mais um dia. Por isso não acesso. Na Veredas usamos o sistema da Dauertec, uma empresa de Santa Catarina, que nos dá o suporte e tem um acervo de referência. Você instala o programa e todos os títulos estão ali, tudo que sai no Brasil. Quando o livro chega para nós é só passar o leitor ótico, se ele está cadastrado, coloca a quantidade e acabou. E agora com esse acervo de referência eles estão me autorizando a ver o acervo da loja pela internet. Estamos em fase de teste. Já tentamos, mas não conseguimos por causa dessas coisas de internet, a configuração não permitiu. Mas eu não tenho tempo. Não posso assumir de olhar internet.  Quando chego na loja tem dez pessoas por dia para falar comigo, fora o telefone. Mas a gente usa muito a internet. O cliente perguntou sobre um livro que não está no acervo de referência, vamos consultar a internet na hora. Compro pela internet para atender o cliente. Mas ainda não estamos usando a internet para a livraria. Tenho um certo receio. Um dia o rapaz da Livraria Cultura deu uma palestra para nós e disse que eles não conseguem atender 15 por cento dos pedidos. Achei uma loucura. Na verdade temos muito medo. Como vamos fazer para atender. O estoque fica errado... Então vou fazer uma coisa certa. A pessoa vai consultar, mas vou colocar um adendo para confirmar  se é possível atender. Na Livraria Cultura, por exemplo, encomendei agora um livro que está esgotado e ela não tem para atender, mas constava que tinha. Então ela também erra. Eu sabia que dificilmente teria.   Se com eles acontece isso, imagina conosco. Este ano colocamos na internet as listas de preço do livro escolar. Ainda estamos mantendo o livro didático, pois o movimento financeiro é maior.  Não dá para descartar as novas tecnologias. Pretendo ter o livro digital, mas não há procura ainda graças a Deus. Eu falo isso o pessoal morre de rir. Mas a gente vai ter que fazer, não tem jeito, como não vai ter? Mas vai demorar a pegar. Saiu uma matéria outro dia em uma revista sobre uma conhecida que trabalha em uma editora em São Paulo. Ela estava em um avião, lendo, e mandaram desligar os aparelhos. Ela desligou o dela e uma pessoa ao lado que estava com um livro na mão disse: “Viu? Não preciso desligar o meu”. Claro que tudo isso vai chegar e vai pegar. O Brasil acompanha tudo, mas o outro não morrerá. No livro há a variedade das capas, o cheiro, que a gente gosta. Na livraria temos um expositor oval, que chamo de navio, onde estão as  novidades, e o cliente vai olhando, circulando. O que não existe com o livro digital. Agora vamos aproveitar a onda do filme "On the Road" e vamos fazer uma vitrine.

A equipe

Tenho funcionários muito bons. Claro que às vezes dá problema. Mas isso é normal do ser humano. Procuro fazer uma coisa harmônica. Dia do comerciário, que é feriado, vou com eles para algum lugar  comemorar. Eles falam que sou a patroa boa. Realmente sou muito boa, mas de vez em quando fico brava com eles. Quando não atendem direito. Quando ficam conversando e não  olham o cliente. Quando fica essa disputa: “Ah! O fulano, não sei o que”. Ficar de cara feia para o cliente, não deixo. Existe um grande troca de funcionários. Muitos se formaram como professores, fazem um concurso, passam e vão embora. Tive uma meia dúzia já nessa loja nova. Este ano tenho tido muita rotatividade, coisa que não era normal na livraria. Fui a duas faculdades e coloquei um cartazinho: “Venha trabalhar conosco – vaga para funcionário”. Na UFF e na Faculdade de Letras, que é particular. Apareceram vários candidatos. A vaga era para rapazes porque tenho que ter um homem de manhã para carregar caixas e outro à tarde. Fui entrevistando alguns. Mas tem um clique que a gente sente. Outro dia, quando ainda estava entrevistando, uma funcionária conversou com um rapaz que tinha ido comprar livro, subiu correndo e disse:” Esse rapaz é muito bom em literatura”. Ele foi entrevistado e no dia seguinte o chamei. Não faz idéia o que ele vende de "Odisseia", de Dostoieviski, etc. E ele estuda administração, não estuda letras. Então foi um achado. E ele é engraçado porque é paulista e fala com o “R” carregado e todo mundo ri do sotaque. Também apareceu outro que se formou em Ciências Sociais na UFF e está se preparando para o mestrado, um espetáculo.  E outro que tinha me pedido emprego há muito tempo, que também estuda letras, se forma este ano, faz curso de teatro no Rio. Então pegamos três agora, da melhor qualidade. Mas é difícil. Tem uma menina ótima no caixa que tem problema quando fala algumas palavras. Mas trabalha que é uma maravilha. Não para. De 9 às 15h direto, só para pra lanche. Eu mesma entrevisto os candidatos ou vem por indicação, como tem acontecido. Estudante de letras, mas estudante de letras não é garantia de bom vendedor. Quer trabalhar, ter seu dinheiro, pagar a faculdade. Tenho livreiros e atendentes. O Marcelo que é gerente, é livreiro. Tem o Julio que está lá há 10 anos e trabalha com livro desde o tempo da Curió. Onde é a nossa filial hoje, já houve a Curió, a Booknet, a Nobel e agora é Veredas. Além do salário pago comissão. As meninas do caixa ganham também porque vendem o tempo todo, mas quem está no escritório não. Então dá um bom dinheirinho por mês, a mais. Procuro valorizar até para eles trabalharem felizes, renderem melhor e se interessarem mais.

Dia a dia.

Trabalho muito. São os funcionários que abrem a livraria. No total são 15 nas duas lojas. Eu estava no subsolo. Começaram a construir um shopping e Paulo ( marido) disse que ia me dar a entrada de presente e eu pagaria o resto da loja. Então ele comprou uma loja nesse prédio, em 1989, em frente aonde eu estava. Só que a obra parou em 1990 e só recomeçou em 2001. Em 2003 nos mudamos para o novo shopping ocupando duas lojas. Depois que abri no novo endereço, em frente ao antigo, o livreiro da Nobel foi aprovado no concurso do Ministério do Planejamento e disse que ia me passar a livraria. Fiquei então com as duas, uma do lado da outra em dois shoppings. Então a Nobel virou Veredas em 2005. Por isso tenho 15 funcionários que trabalham em dois turnos: 9 às 15h e 15 às 21h. Mas existe diferença de acervo . O que vende em uma não vende na outra e vice versa. O público é diferente. São o Sider Shopping e o Pontual Shopping. Sider de Siderúrgica.  No Sider Shopping temos uma loja no subsolo que só vende, não tem escritório. A matriz é bem maior, oferece muito mais livros e mais espaço. Repetindo algo que já falei: fazemos vitrines muito bonitas em que a gente faz decoração temática. Tem vitrine de festa junina, de dia dos pais, de dia das mães, de dia da criança, dia dos namorados. Temos um vitrinista que é de um bom gosto extraordinário. É terceirizado.  No ano novo a gente coloca sempre livros de capa branca. Até a TV Regional fez matérias sobre a vitrine. O vitrinista cobra caro, mas faz bem feito. Na época de movimento escolar colocou um quadro negro com o horário das aulas, as matérias. Fora o Natal, o dia em que a gente mais vende é o dia das mães. Acho que fica meio empatado com o dia dos pais. Porque o pai, o homem, ganha mais livro de presente. Nesses dias a livraria do Sider Shopping vende mais, porque o outro Pontual tem menos público. Na minha avaliação foi um complemento muito interessante. Não deixei uma livraria de fora ocupar o espaço. Quando a Nobel estava lá a concorrência era grande. Eu vendia menos e ele também. Quando mudamos de endereço e ficou aquela livraria linda, as pessoas passaram a ir mais na nossa. Mas independente de estarmos ali, a deles ficava em um shopping onde o público passa e vê, entra e compra. Clientes nossos diziam:”Ah Solange. Passei lá e comprei.” O Shopping da nossa matriz não tem uma praça maravilhosa de alimentação, não tem âncora, não tem loja grande. O outro tem 4: Casa e Vídeo, Renner, C&A e Leader. Então é muito forte, com gente o tempo todo. Hoje abriram uma nova franquia da Nobel em outro bairro. Abriram, nunca falaram nada conosco, nunca se apresentaram. Ainda não fui lá porque não tive tempo. Mas vou para conhecer e apresentar a nossa associação.

Os feriados

É muito ruim. Um monte de feriados em um mês acumulado complica. Em abril a minha loja não funcionou por oito dias, foram 3 feriados e 5 domingos. Isso deu uma queda nas vendas de 15 a 20 por cento em relação ao ano de 2011. É muito significativo. Sei que temos de ter feriados, que temos de respeitar algumas datas. Mas temos de lutar pelo não exagero. Tive informação de que algumas entidades de nível nacional estavam tentando reverter esse feriado de 23 de abril, mas até agora não conseguiram. Em Volta Redonda posso abrir a loja desde que pague hora extra em 100 por cento, passagem e lanche. Com a cidade toda parada, não tenho garantia de venda para pelo menos cobrir essa despesa. A gente acaba desistindo. Este ano fiz obra na loja, mas muitas vezes não abre mesmo. A loja do Sider abre de domingo a domingo.  Fui criada na Igreja Católica. Hoje não sou praticante. Mas o feriado de Corpus Christi, por exemplo, hoje perdeu o sentido  com essa diversidade religiosa . É só para o católico.  Acho o 12 de outubro, dia de Nossa Senhora Aparecida, mais lógico. É a padroeira do Brasil. Na minha visão tem uma diferença muito sutil, mas tem. Teria que ter um feriado para cada um, para o espírita, para o pentecostal, para o neo pentecostal que hoje cresce dia a dia.  Mas o mais lógico é não ter para ninguém. Agora na Rio +20  foram 3 dias de ponto facultativo no Rio. No Centro se perde muito com isso. As pessoas não vão, os restaurantes perdem, o comércio de rua perde. Eu abriria em função do movimento, já que tem milhares de pessoas de fora circulando.

A classe

Nós livreiros somos pessoas diferentes e extremamente conscientes. Gente que acompanha, que sabe o que está acontecendo no Brasil e no mundo. Você trabalha com a cabeça das pessoas. O cliente entra na loja e você sabe o que ele quer. A gente fala: ” Esse livro aqui veio para você”. Isso é ser muito especial. É diferente de comprar uma indumentária, de uma coisa que só tem beleza. Porque ele vai para casa, vai ler aquele livro e vai se modificar. O livro salva vidas. Quanta gente entra deprimida, conversa, a gente oferece um livro e eles voltam, agradecem. É completamente diferente, um outro prazer de comércio. Conseguimos promover palestras sobre qualquer coisa. Este ano juntamos 30 pessoas na livraria só para ler Clarice Lispector. Isso é diferente. Você está formando um cidadão mais consciente, com capacidade de escolher depois em quem ele vai votar. A surpresa para nós agora é ver como está vendendo a biografia do Getulio. Estamos vendendo livros de filosofia todos os dias. Livros de mitologia sendo lidos por meninos de 10,11 anos. E isso só acontece porque tem a livraria, não foi porque viu na internet. A mãe chegou para mim e disse: “Ah, ele está gostando de mitologia”. Botei o livro na mão dela e no sábado ela vem me dizer da alegria do menino. Tem uns jovens lá que digo para eles: “Vocês têm dificuldade de arrumar namorada”. Porque o que eles lêem não é brincadeira. Para mim esse papel da livraria é fundamental. A visita das crianças à livraria, eles nunca esquecem. Voltam com pai, com mãe, com avó para mostrar onde foi a atividade.  A professora diz: “ o livro custa 17 reais, você deu 20. Qual é o troco?” Você faz uma atividade pedagógica com uma visita à livraria. Hoje é muito difícil ter isso nas mega livrarias. Na mega penso que é mais difícil essa relação vendedor cliente.

A militante

Sou militante desde sempre. Fundadora do sindicato dos professores de Volta Redonda, fundadora do Sindicato dos Profissionais de Educação, que hoje é o SEPE. Sou filiada ao PT desde 82. Nunca sai, nunca deixei de participar. Fui secretária de Educação em Volta Redonda por causa disso. Porque o PT indicou meu nome. Lá sou referência no PT. As pessoas me procuram, pedem opinião. Sou identificada com o partido, participei muito. Como secretária regional do SEPE visitei todos municípios da região. Antes do PT, por eu ser uma pessoa bem dinâmica e muito conhecida era procurada pelo MDB para ser candidata a vereadora. Mas não cheguei a me filiar. Não tenho interesse político nessa área. Acho que o vereador não cumpre o papel político que lhe compete, que é o de legislar e fiscalizar o executivo. O vereador tornou-se um despachante de favores.  Para isso não preciso ser vereadora. Já faço todo dia. Se tivesse de me candidatar a alguma coisa seria a prefeita. Mas nós estamos descambando, o PT no estado do Rio é muito fraco. Não consegue crescer. Lá na região nós já tivemos uma prefeita em Barra Mansa que depois não conseguiu voltar. Tivemos uma vice-prefeita em Barra do Piraí. O PT de hoje não é o PT ao qual eu me filiei,  mas é o partido para o qual eu luto que ainda exista. Mantemos nossos princípios éticos. Tentamos fazer as coisas de forma diferente. Mas é difícil. Imagino o que a Dilma está passando. Porque nessa hora não tem ideologia que se imponha e se mantenha. Se não negociar não governa. Também tinha de ter uma reforma política para rever o custo de campanha eleitoral. Uma campanha para prefeito custa 5 milhões, para deputado, 3 milhões. Você vai gastar 5 milhões e não vai querer de volta? Nós fizemos muita campanha em Volta Redonda de pé no chão, andando, desde 82. Fazendo com que o PT se tornasse conhecido. Tem gente que se lembra de mim com megafone em cima do caixotinho. Infelizmente isso se perdeu. O povo também se desmobilizou demais. A gente não consegue fazer mais assembleia em Volta Redonda, que não é como o ABC paulista, mas que teve uma história muito forte no sindicalismo. Nem professor, que é uma categoria consciente, formada, se mobiliza mais. Atribuo isso à acomodação Minha cabeça não mudou nesses 30 anos. Continuo lendo, acompanhando. Seleciono. Não leio qualquer coisa que ideologicamente está contra o que eu penso. Mas mudou muito. Não sei se é a televisão que faz a cabeça das pessoas. Ninguém sai. E fica difícil porque se você não tem povo, você não muda. Se sou prefeita, com um projeto que beneficia a população, mas o vereador quer dinheiro, vou chamar o povo para ir para a rua. Volta Redonda tem um mérito que é o Movimento pela Ética na Política. Fazem abaixo assinado, cobram dos vereadores. Os vereadores queriam se dar aumento de 50 e tantos por cento.  O pessoal se mobilizou. Não tiveram. Colocaram 38, mas diminuiu. Como professora também era bastante mobilizada. Hoje a greve está muito desgastada. Cansou. E sempre o aluno sai perdendo, por mais que a gente reponha. O ensino público já tem muitos problemas e a greve só acentua os problemas. Não sei lhe dizer o que fazer. Mas a greve não resolve mais. Acho que os mais conscientes e mobilizados estão aposentados. E o pessoal novo que está chegando agora pegou essa forma de fazer política que não mexe com alma deles. O que desmobiliza o professor é ter que dar aula de manhã, de tarde e de noite para ter um salário razoável. Tem de se manter atualizado, tem de estudar. A própria estrutura do estado e da prefeitura proporciona pouca formação. Estou fora de sala e não sei como funciona hoje, se essa onda tecnológica está substituindo o professor. Mas imagino que mexa muito também. Não quero dizer que o professor não tenha consciência dos problemas. Mas não consegue dar conta.

Idiomas

Estudo francês toda semana. Ano passado estive na França e deu para gastar, me fazer entender. Cheguei a ajudar as pessoas. Ajudei  um  brasileiro no hotel pedindo presunto e a mulher olhava brava para ele, não entendia. Gosto muito de francês. Estudo por estudar. Inglês eu fui muito boa aluna, mas hoje não sei mais. Gosto do francês.  Espanhol dá para se comunicar, mas achei que na Argentina não se entende nada do que eles falam. Quando ligo um canal de tv espanhola entendo o que falam, tranquilamente. Quando fui ao Peru vi que todos europeus que estavam lá falavam espanhol. Entendi que eles se preparam para ir para lá. Vi francês, alemão, holandês, todo mundo falando espanhol direitinho, se comunicando. Meu espanhol dá para quebrar o galho,  mas tenho ideia de fazer um curso para me expressar melhor. Mas minha paixão é Francês. E não é Freud que explica. Minha história é assim: No ginásio tinha um ano de francês. Quando comecei, era colégio de padres, e um deles foi dar aula de francês. Achei aquilo muito fácil. A conjugação é igual a nossa. Acertei tudo na prova e ele foi até a minha casa dizer para meus pais que nunca tinha dado um dez em francês. E tomei gosto. No científico tinha uma professora brava. Toda a aula tinha de ser em francês. Depois parei. Não tive condições de estudar línguas neo-latinas que era o meu desejo. Fui ótima aluna de latim também. Mas não tinha como estudar fora. Meus pais não tinham como me bancar no Rio. Como era ótima aluna em matemática e meus irmãos davam aula de matemática , também passei a dar aulas dessa matéria. Então o projeto parou. Mas há um tempo atrás disse: “ Vou estudar francês de novo”. Pelo prazer de estudar, ler. As minhas aulas são difíceis, é aula particular. Ela vai para a livraria leva o texto, tem interpretação, gramática, conversação. É um prazer. Devo ter morado lá em outra vida. Hoje não consigo mais estudar inglês e também não faço questão. Acho um exagero. Esse domínio que ela tem aqui me incomoda. Tudo tem de ser em inglês, os nomes das lojas. Fico com raiva e crio uma barreira psicológica.

Os filmes

Hoje no shopping temos 4 cinemas. As pessoas saem de lá e vão comprar o livro. Ou o inverso, compra e depois vai ver o filme. Isso aconteceu com o "Código Da Vinci", com o  "Crepúsculo". Nesse, as pessoas saiam quase chorando e iam enlouquecidas comprar o livro. Os outros da série também. Agora mais recente teve o “Comer, rezar e amar”. Vende-se bastante em função dos filmes. Mas era para estarmos fazendo as coisas junto com os cinemas. Sou eu no subsolo e eles no quarto andar. Mas não vi interesse, mesmo eles sendo amigos de muitos anos. Eles perdem e eu também. Podíamos fazer alguma coisa legal, como um debate. Sou cinéfila , mas acho sempre que o livro é melhor, como em “Comer, rezar e amar”. Acho que quem assiste o "Código da Vinci" sem ter lido o livro não entende. Em cinema gosto de tudo. Hoje o filme nacional está muito bom. Agora a Globo pegou o mote dos livros espíritas. Vi os três:" Bezerra de Menezes", "Nosso Lar" e" Chico Xavier". Mas tem os filmes que mostram a realidade para mexer com o consciente. Tem um que não consegui acabar de ver: “Bicho de Sete Cabeças”. Vi até a metade. Muito duro aquilo. A  gente sabe que aquilo é verdade. Mas não consegui acabar de ver o filme. Tem muitos filmes nessa linha. “Tropa de Elite” também não vi. Nem olho para essas coisas. Talvez meio freudianamente esteja fugindo da verdade. Mas o cinema perdeu muito. A minha geração se arrumava para ir ao cinema. Era um programa. Acho que hoje o jovem vai mais ao cinema,  o shopping fica lotado. Mas aquela coisa nossa, de filme francês cult não tem mais. A não ser quando tem festival. Mas filme de festival não vai lá. Tem muito festival de cinema  agora. Mas o cinema perdeu muito.  Não gosto de ver filme em televisão. Raramente faço isso. A não ser quando me indicam: “ Vê que é bom”. Não tenho prazer de sentar para ver um filme na televisão, gosto de ir ao cinema. Eu ia sozinha aqui no Rio para tudo quanto é filme. Uma vez quem sentou do meu lado na sessão das dez de um festival foi o Ipojuca Pontes, que foi ministro da Cultura. Ele fazia uns comentários durante a sessão. Era um filme tcheco, no Ricamar, em Copacabana. Depois saímos e fomos comer uma pizza. Conversei muito com ele. Em Volta Redonda tem uma coisa que é um cinema de 1500 lugares feito pela CSN.  Ano passado completou 50 anos, E enchia. Eu ia muito ao cinema, com meus pais, com amigos. Hoje ainda funciona como cinema. Tem formaturas, shows, mas também passa filmes. Em Volta Redonda temos seis salas de cinema no total.

 

A música

Fui geração bossa nova, seresta. Virava noites cantando com meu irmão, que toca violão, e os amigos. Hoje, a música brasileira dá vontade de chorar. Fui ao aniversário da sobrinha neta no sábado e só tocava Michel Teló e o Tchum e o Tcham. Precisei até sair um pouco. Quando voltei disse para o DJ:” Mas sai estava tocando isso e voltei está a mesma coisa”. Ele nem teve o que me responder. Aí joguei a toalha. Não tem jeito. Qualquer festa que você vai toca isso. Hoje o funk toca menos. Quero olhar o funk fazendo a análise sociológica que algumas pessoas fazem. Não é contra, para ser do contra. Mas algumas letras não ajudam  na educação do jovem. Não agregam valor. Qual será o futuro? Nós somos geração Bossa Nova com quem está aí até hoje: Chico Buarque, Caetano Veloso, MPB 4, Elis Regina. E alguns que aparecem estão cantando esses autores. Mas tem novos bons também. Tem cantoras ótimas. Sou fã do programa do Rolando Boldrin. Aparece cada cantora lá de cair o queixo. Eu vi Fabiana Cosa nesse programa e comprei um DVD, uma coisa linda. Mas não aparecem. Essa mídia às vezes até é perversa de boicotar outros artistas. De vez em quando estoura um bom que depois some. Pensa na Leila Pinheiro, cadê? Vejo pouquíssimo televisão. Não tenho o hábito de chegar e ligar. Na minha casa não tem isso de ligar tv de manhã, absolutamente. Porque ainda estou nessa história de mudança, tenho dormido na casa dos meus irmãos e seis horas da manhã a televisão está ligada. Fico assustadíssima. Levanto, pego meu carrinho e vou embora. E é tv em todos os cômodos, na cozinha, na sala, no porão. Domina muito a sua cabeça. Não tenho dúvida disso. Acho que bitola muito as pessoas. Elas já saem de casa com aquilo fechado e amarrado na mente. A linguagem do jovem para mim também está muito complicada. A forma como eles se comunicam: “... porque a parada”. Eu digo:” Não sei o que é parada”. É cara para cá,  cara para lá e eu digo: “ Não sou cara”. Há um exagero e não são só os jovens. Tenho funcionários de trinta e poucos que ficam: " O cara, o cara”.

A Biotipologia

Particularmente não sou uma pessoa muito alternativa. A não ser na alimentação que faço a Biotipologia, do Carlos Beretta, baseada na medicina chinesa, coreana, egípcia. Segundo ele, em qualquer lugar do mundo as pessoas se encaixam em um dos quatro biótipos com que trabalha:  renal, pulmonar, cardíaco e hepático. Não que o renal tenha a ver com o rim. São características da pessoa. Ele fez o meu biótipo pelo telefone. Respondi algumas perguntas e ele disse: “Você é renal, fleugmática. Você tem os cabelos sedosos, só usa esmalte escuro, adora as coisas douradas, admira coisas antigas.” E nunca tinha me visto. É que todas as renais, tem as mesmas características. Ele me mandou a dieta pela internet e comecei a fazer. A minha estrutura física foi se modificando. Emagreci muito, mas não fiz para emagrecer, fiz para ter saúde. Não como sal, como pouco trigo, como muito milho, não uso queijo, leite. Para cada biótipo ele tem o recomendado e o não recomendado. Na época emagreci dez quilos. Ele foi lá em outubro, voltou em novembro e disse: “Sua pele está diferente.” Se eu me encher de sal, de açúcar, de queijo e leite eu ficarei doente com certeza. Moro em fazenda, onde tem leite de vaca e não tomo absolutamente. Só carne branca. Mas não é alimentação alternativa. Tem muita gente que não come carne vermelha por opção, mas pode comer à vontade. Não é a dieta do tipo sanguíneo, mas no meu caso coincidem algumas coisas. Na minha casa a comida é sem sal. Mas se for comer só o que posso mesmo tenho de morar em um lugar afastado do mundo. Vou muito a festas e aí como uma coisinha, levo minha comidinha na bolsa. No meu caso o álcool pode: conhaque, vodka. O conhaque feito de gengibre, que é permitido na minha alimentação. Tem biotipo que pode beber vinho, outro bebe cachaça, outro uisque. O biotipo cardíaco pode beber cerveja.  A história é que existia um padre em Limeira, São Paulo, que indicava  essa alimentação, tenho até a apostila dele. Para mim o importante é a cura. Há relatos de cura de câncer. Mas é difícil, não é para qualquer pessoa. Sou muito disciplinada. Não pode, não pode. Tá lá naquela mesa, não pode comer, não como. Resisto mesmo. O café sem açúcar eu tomava antes da Biotipologia. É muito mais saudável e posso tomar à vontade.