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Livreiros em Paraty
Paraty é o segundo polo turístico do estado do Rio de Janeiro, depois da capital. O maior fluxo anual de visitantes ocorre durante a FLIP, quando a cidade recebe muitos livreiros — vários a negócios, com amostra de seus acervos.
Caravana de livreiros da Casa 11, do Rio, na Festa Literária Internacional de Paraty, 2025 As livrarias Belle Époque, Córdula e Janela, da chapa eleita para a presidência da Associação Estadual de Livrarias RJ, no dia 6, trabalharam na Festa Literária Internacional de Paraty este ano. A Travessa, outra associada, é a livraria oficial do evento há 13 anos. Na elaboração do programa da chapa para a eleição na AEL, o entusiasmo dos que foram à FLIP levou ao debate sobre a ida da entidade à Paraty, em 2026, com uma casa de livrarias associadas. O presidente eleito, Ivan Costa, aprova a ideia. Sugere um ônibus fretado para os livreiros e distribuição gratuita do Guia de Livrarias da Cidade do Rio de Janeiro, a ser lançado em breve, na Casa da AEL, onde também haveria venda de livros e programação de eventos. Na estreia na FLIP este ano, Ivan expôs amostra do acervo da Belle Époque na Casa Kalundu, com programação voltada à cultura afro. ”A casa é de um pai de santo, um quilombo, como o pessoal chama” explica. “É importante sair do nosso local de trabalho e ser reconhecido,” afirma ele. Entre outros reencontrou Ruy Castro, que o visitou em 2023, na reinauguração da Belle Époque, no Méier, após o incêndio na livraria, no ano anterior. Também na Casa Kalundu ficou a Livraria Córdula, de Diogo Santana, eleito Livreiro do Ano pelo PublishNews/Catavento. “O público estava entusiasmado em saber que existe uma livraria na Baixada Fluminense.” comemora ele, fundador da Córdula em 2023, em São Joâo de Meriti. “Tradicionalmente vista como um evento elitista, a FLIP está se abrindo a novos olhares e perspectivas, especialmente os da periferia,” observa Diogo, que participou de uma mesa sobre livrarias físicas na Casa PublishNews e outra sobre autores periféricos na Casa da Favela. A Janela Livraria, com lojas no Jardim Botânico e Gávea, tem casa em Paraty há quatro anos em parceria com a editora Mapa Lab. Teve programação gratuita intensa com Itamar Vieira Júnior, Jefferson Tenório, Conceição Evaristo na casa Caixa de Histórias. Em 2024, a direção do evento anunciou que as casas participantes não poderiam comercializar livros, por, entre outros motivos, causar sobrecarga no território sensível de Paraty. Mas voltou atrás com a pressão dos livreiros e editores. A FLIP, inaugurada em 2003, foi idealizada pela editora britânica Liz Calder , inspirada no Festival Literário de Hay, no Reino Unido, que começou em 1988 e foi apelidado de Woodstock da Mente. Hay-on-Wye, sede do evento, é uma cidade com cerca de 1.900 habitantes e conhecida como A Capital dos Livros; abriga 13 livrarias, segmentadas ou gerais, em sua maioria dedicadas a raridades e livros usados,. Paraty, fundada em 1667 e batizada com o nome do peixe de água salgada, tem cerca de 45 mil habitantes. Com a libertação dos escravos, as plantações de cana da região foram abandonadas e a cidade ficou isolada com acesso à capital apenas pelo mar. Na década de 1970, com a inauguração da rodovia Rio-Santos, que a reintegrou ao estado, o jornal O Globo publicou, em 9 de setembro de 1975, a manchete: Turismo é o mais novo problema. A primeira livraria da cidade foi inaugurada no ano 2000: a Livraria de Paraty. A princípio, ocupou a Casa de Amyr Klink, navegador e escritor, com acervo ligado à história, fauna e flora da cidade. A riqueza natural e cultural de Paraty fez que, em 2019, a UNESCO a declarasse Patrimônio Mundial da Humanidade na categoria misto – histórico e natural – título que só ela tem na America Latina. Em 2014, a cidade ganhou a Livraria das Marés, do grupo que também opera o restaurante Quintal das Letras e a Pousada Literária. Esta, promove, em setembro, uma imersão criativa com Itamar Vieira Junior, autor de Torto Arado, com estadia por três noites a partir de R$ 9 800. Muvuca, a terceira e mais nova livraria da cidade, surgiu em 2022. “ Paraty é culturalmente muito viva.Tem as comunidades quilombolas, indígenas e caiçara, tem moradores do Uruguai, Argentina, Chile, Equador” diz Guilherme Truque, o fundador. “A ideia é de uma livraria que dialogue com a cultura popular, dando visibilidade a outras literaturas,” acrescenta. Na FLIP, a Muvuca prestigia autores locais. Ela tem selo editorial e, entre outros, publicou Mestra Benedita Martins, artista quilombola da região. A Livraria da Vila, de São Paulo, foi a primeira livraria oficial da FLIP. Sua participação reacendeu a discussão sobre as influências na cidade que pertenceu à capitania paulista no século XVIII. Em 7 de outubro de 1952, o jornal o Globo publicou a manchete: “Acusado o prefeito de querer ‘doar’ Paraty a São Paulo.” “Estávamos sempre muito felizes em participar”, relembra Samuel Seibl, dono da livraria paulista . ”Mas é uma operação grandiosa. Caminhões”, diz ele: “Chegamos a um momento de crescimento da livraria, que demandou o mesmo grupo que fazia a FLIP.” “Nas livrarias é que as coisas acontecem .” afirma Samuel “ trabalhamos com a ideia de que tudo começa na livraria”. Para ele uma diferença entre a FLIP e a Bienal, é que nesta o desconto no preço do livro está disseminado . “Na FLIP isso não existe”, garante. “Paraty parece um portal. Outros lugares como Ouro Preto criam esse ambiente”, compara. Samuel. “Simpatizei bastante com a mesa da Marina. Mesmo ela, que tem presença como ministra, falou de literatura. Foi ótimo”. A Livraria da Vila ficou na FLIP de 2004 a 2012, e foi substituída pela Livraria da Travessa. Benjamin Magalhães, responsável pelas operações da livraria carioca na cidade nos primeiros cinco anos fala da estrutura exigida: “Eu chegava em Paraty na sexta-feira anterior à FLIP. No sábado vinham os caminhões que precisavam de autorização especial para entrarem no centro histórico. Levávamos dois dias para montar tudo e na terça, véspera do evento, fazíamos um pente fino.” Segundo ele, no começo não havia editoras vendendo ao público; “ Isso foi um grande diferencial para nós. Chegamos a vender 25 mil livros.” Na edição deste ano, segundo a Livraria da Travessa, a venda ficou em torno de 20 mil. Para Benjamin, hoje na Lima Barreto, em Ipanema, o público da FLIP também tem seu diferencial: “é mais velho, já é consumidor de livros. A Bienal é muito voltada para os jovens, para as escolas.” Ele afirma que o ambiente da Festa Literária replica melhor o ambiente das livrarias. Presente em Paraty estava Susana Fernandes, Secretária Geral da AEL. Ela foi a 10 edições da FLIP, e teve um motivo de orgulho nesta; Walter Hugo Mãe, a grande atração, o mais vendido na livraria oficial, foi levado antes por ela, em maio, para falar para uma plateia que lotou a Casa 11, em Laranjeiras. Outra sócia da Casa 11, Ana Mallet, esteve 17 vezes na FLIP mas não imagina ter uma casa no evento; “Teríamos muito tempo trabalhando, sem aproveitar.” Ela afirma que, além dos aluguéis altos, os preços para o público estão mais caros que antes. Mas elogia o telão que permite ver os debates de graça e a transmissão pelo YouTube. “Uma das críticas à FLIP é de ser para um público privilegiado, financeira e culturalmente, principalmente pelos preços das pousadas. Por outro lado ela incentivou a realização de muitas festas literárias pelo país.” constata Ana. A Casa 11 promoveu a primeira FLILA, Festa Literária de Laranjeiras, em 2024, e este ano volta com o evento. A Flipetrópolis, que também teve a primeira edição em 2024, na cidade de Petrópolisj, estado do Rio, anunciou a nova edição para setembro de 2025.
Kleber Oliveira Para AELRJ 18/08/2025 |



